terça-feira, 14 de junho de 2011

Experiência: a nova classe média vai às compras

Toda a realidade e simplicidade da classe emergente são levadas na hora das compras. Não é fácil passar a nova classe média para trás, pois ela não libera seu suado dinheiro para o que realmente não acredita, mas também não possui conhecimento técnico para a compra de um eletrônico, por exemplo.
Ivany foi a uma loja da Casas Bahia, na avenida Cupecê, para adquirir uma câmera fotográfica digital. A loja é apenas uma das filiais da Casas Bahia (leia mais no decorrer da matéria), que está presente em 270 municípios de 11 Estados brasileiros. A marca é conhecida por ser o empreendimento que mais atrai a base da pirâmide.
A vendedora recebeu Ivany com beijos e abraços, pois já a conhece de longa data. Quase toda a casa da família foi mobiliada naquela loja. Olha ali o sofá que eu comprei é igual àquele. Mas eu paguei mais barato , lembra Ivany, que afirma gostar do atendimento e das condições de pagamento.
Na hora de escolher a câmera, a primeira triagem consistiu na forma de abastecimento de energia do equipamento. Nada de pilhas, Ivany foi direto às que eram alimentadas por bateria. Por eliminação, a câmera cor de rosa da Kodak foi escolhida pela beleza e pela marca. A resolução é de 14 megapixels e ainda vem com cartão de memória de 2 gigabytes , explica a vendedora sem receber resposta. Junior, que é neto de Ivany e pai de Thaynná, mas mora com a nova família, levou as duas até a loja e questionou sobre o tamanho do cartão de memória. Foi esclarecido pela vendedora que era maior do que o do celular. O pagamento à vista do equipamento, que custava R$ 399, gerou o diálogo a seguir: – Tem desconto para pagamento à vista? – questionou Ivany, e justifica – ela sabe que eu pechincho.
A vendedora consulta o sistema e avisa que o equipamento não tem desconto.
– Mas nem se chamar o gerente, como da última vez? –, lembra a aposentada, que diz ter conseguido um bom abatimento do valor com ele nas últimas compras. – Não, nesse caso nem o gerente poderá dar desconto. É do produto mesmo –, encerrou a vendedora.
Uma semana depois, Ivany diz que ficou feliz com a aquisição. A câmera é muito boa, já tirei fotos dos bisnetos que vieram me visitar no final de semana , comenta. Sobre as informações que a vendedora passou na loja, a aposentada afirmou que não entendeu bem. Essas coisas não entram muito na minha cabeça . Por essa razão, pediu para o neto ler o manual e explicar as funcionalidades do equipamento.
A classe C está disposta a comprar e realizar aquilo que muitas vezes ficou no imaginário e no quem sabe um dia... . A insegurança, o medo e a falta de informação ainda são responsáveis por uma massa que não tem consciência do poder que possui na economia do País. Para os empresários alcançarem essa parcela da população, é preciso investir na inclusão; afinal, a classe C quer ser ouvida, vista e realizar seus desejos, mas também quer ter a certeza de que não vai acordar do sonho a qualquer momento e se deparar com contas que não conseguirá pagar.


Ascensão na ponta do lápis

Na mesma região da família de Ivany mora o pintor Valter Umbelino de Araújo, de 38 anos, que também ilustra a nova classe média. Araújo tem dois filhos do atual casamento, um de dois anos e outro de seis. A esposa está desempregada há cinco meses, mesmo assim a renda familiar hoje é de R$ 2.400.
Araújo leva os estudos a sério e acredita que investir em educação é o melhor caminho para angariar um futuro próspero, assim como Marlon, neto de Ivany. Ele pensa em começar um curso técnico de edificações no meio do ano e está escolhendo entre a Universidade Nove de Julho (Uninove), a Universidade Cruzeiro do Sul (Unicsul) e o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai).
Quando vai às compras, a família de Araújo se preocupa com a qualidade e não abre mão de olhar o vencimento dos produtos, por exemplo, sem deixar de colocar o preço na balança. A qualidade é mais importante, o preço é só uma base , explica. Antes de enfrentar as compras, a esposa pesquisa onde o mar está favorável para ancorar seu carrinho de compras.
Lojas que deixam a responsabilidade e autonomia nas mãos dos clientes não são as favoritas. O consumidor da classe C começou a experimentar o consumo agora e precisa que alguém o leve pela mão, e essa é a expectativa do pintor ao visitar o varejo. Quando entro na loja gosto de ter um atendente para me orientar, para eu não ficar perdido e sem saber o que fazer , conta.
A família Araújo já realiza sonhos de consumo que antes eram inacessíveis, mas ainda quer mais e sabe que pode alcançar. Este mês eu queria comprar uma moto, mas conversei com minha esposa e chegamos à conclusão que ainda não é a hora. Já tenho um carro para a família , conta. Nos preparamos para comprar material de construção e uma televisão com tela de plasma. Já temos nossa casa, mas queremos construir uma casa para o meu pai , complementa. Os investimentos passam pela avaliação da calculadora, que deve mostrar uma cifra que cubra todas as contas no fim do mês.

Fonte: Revista Consumidor Moderno